Origens e História dos Banu Amghar
Os Banu Amghar eram uma família de "marabouts" (homens sagrados) descendentes do Profeta Muhammad (saws) por meio da linhagem "Fatimi-Husseini”, ou seja, descendiam do profeta Muhammad (saws) através de seu neto Hussein (r.a) - filhos do sheikh Abi Uthman Said bin Abi Zakaria Yahia bin Abi Shakir Hammad bin Abi Sulaiman Dawud bin Abi Zakaria al-Hunaif.
Suas origens no Marrocos, ligadas à fundação do Ribat Tit-n-Fitr, um centro de ensino sufi, estão bem documentadas em grande parte devido à existência de uma biografia do século XIV de seus homens sagrados, chamada Bahjat al-Nazirin wa Uns al-Arifin wa Wasilat Rabb al-Alamin fi Manaqib Rijal Amghar al-Salihin de Muhammad bin Abd al-Azim al-Zammuri.
A maioria dos relatos recolhidos nesta biografia determina as origens do fundador do Ribat Tit, Shihab al-Din Abu Ibrahim Ismail bin Said Amghar, em Medina, onde era conhecido como um asceta e como um firme aderente dos caminhos dos Salafi al-Salih (Predecessores Virtuosos - título que se refere às três primeiras gerações de muçulmanos).
Depois de se estabelecer na aldeia costeira de Jedá, ele começou a ouvir uma voz dizendo-lhe para ir ao Magrebe para que seu wird (invocação) e sua família fossem de benefício lá. Finalmente a voz lhe falou diretamente: "Ó Ismail! Vá para o Magrebe e siga a luz diante de ti. Onde quer que a luz se estabeleça no Magrebe deves ficar, pois será um lugar de salihin (virtuosos)”.
Acompanhado por seus dois irmãos, Ismail Amghar viajou através do Magrebe até alcançar a costa atlântica do Marrocos, seguindo a luz (significativamente chamada de al-Nur al-Hashimi) até que se estabeleceram em uma ilha ao largo da costa.
O segundo sheikh do Ribat Tit-n-Fitr, Zayn al-Abidin Abu Ja'far Ishaq b. Ismail Amghar, é o primeiro a respeito do qual o texto de Bahjat al-Nazirin contém material factual e datado. O mais antigo deles é um decreto promulgado por Tamim b. Zii b. 'Atiyyah (o governante Ifranida do norte do Marrocos aliado dos Omíadas da Espanha) no ano 409/1018, autorizando Abu Ja'far e seus descendentes a cobrarem um tributo anual para manutenção de sua família, servos e associados em troca de seus serviços jurídicos, desde que ele e seus descendentes mantivessem um alto nível de conhecimento nas ciências religiosas e não se transferissem para outra localidade.
Também é atribuído ao Sheikh Abu Ja'far lshaq Amghar o mais antigo credo teológico (Aqida) datado e elaborado por uma figura religiosa marroquina. Supostamente escrito em 412/1021 em resposta a comentários sobre a natureza de Deus, endereçado a um estudioso em lfriqiyyah, o credo diz, em parte:
Creia que [Deus] é Único em quatro aspectos: sem limite, sem número, sem diferenciação [não é permitido conceitualmente dividi-Lo em diferentes aspectos], e Único em Seu Domínio. Não tem parceiro algum; Ele é Único nos atributos da Perfeição - nada tem atributos como Seus Atributos. Exaltado acima da existência de opostos ou prole; livre de semelhança com corpos físicos. Ele faz milagres aparecerem nas mãos de Seus mensageiros e os torna indicadores [apontando] para Seus vários caminhos. Próspero é aquele que acredita em todos eles para afirmar a Verdade e segue suas leis para se estabelecer com firmeza. Aconselho-o a acreditar em Deus Todo-Poderoso e a não ser excessivo em devoção externa, ignorando a vida interior; pois o trabalho do espírito interior é mais excelente que o do exterior. O exemplo [a seguir] e o grupo [com o qual se identificar] é o dos Companheiros [do Profeta], que Deus esteja satisfeito com todos eles.
Por volta do ano 475/1083, Abul Budala Rukn al-Din Abu Abd Allah Muhammad b. Ishaq Amghar sucedeu seu pai como sheikh principal do Ribat Ti-n-Fitr. Reconhecido em todo o Marrocos como uma das maiores figuras religiosas da sua época, era famoso por seu conhecimento do Alcorão e habilidade em seu comentário. Juntamente com seu filho, Abu 'Abd al-Khaliq' Abd al-'Azim, tem o crédito da fundação da primeira ordem sufi marroquina, a Sanhajiyyah, mencionada pelo viajante do século VIII / XIV e estudioso religioso lbn Qunfudh como uma das cinco principais ordens marroquinas existentes durante o apogeu do poder político Marinida. Até meados do século XV um dos maiores dos sufis marroquinos, Muhammad b. Suleiman al-Jazuli, traçava sua linhagem espiritual através do sheikh do Ribat Tit.
Embora não possamos mais ter uma visão completa do método espiritual da Taifa al-Sanhajiyyah, um esboço é fornecido por várias fontes contemporâneas. Sabemos, por exemplo, que Abu Abd Allah Amghar era um firme aderente da escola Maliki de Jurisprudência e que, como seu pai e seu avô antes dele, enfatizava a firme adesão ao exemplo dos Salaf al-Salih. Essa atitude é coerente com a então tendência popular marroquina sufi, afastando-se da teologia especulativa na direção de uma ortodoxia “pura”, orientada para a jurisprudência Maliki. O método sufi da Sanhajiyyah parece ter sido fortemente ascético e mais sintonizado com o pietismo de figuras como al-Hasan al-Basri do que com as práticas dos sufis filosóficos no Oriente muçulmano do século XII.
De seu filho e sucessor , Abu 'Abd al-Khaliq' Abd al-'Azim aprendemos que, juntamente com seu amigo mais velho Abu Shuaib Aiyub al-Sanhali (o famoso "Sidi Bushaib", fundador da Ribat Azammur), o sheikh exigia de seus seguidores a adesão a dez mandamentos conhecidos como "Regras de Companheirismo” (Shurut al-Suhbah):
- Evitar controvérsias entre os murids (discípulos) e os outros.
- Justiça.
- Obrigação de ter um caráter nobre.
- Constância e satisfação com o que Deus oferece.
- Perdão dos atos nocivos cometidos pelos outros.
- Preservação das realidades transcendentes dos não iniciados.
- Ocultação dos pecados dos outros.
- Esquecimento da necessidade de ter a última palavra em uma disputa.
- Satisfação com o que acontece com mais facilidade.
- Alimentar-se do que estiver disponível.
A importância do maior sheikh do Ribat Tit-n-Fitr para o desenvolvimento do Sufismo marroquino não pode ser subestimada. Além de sua amizade com Abu Shubayb de Azammur, Abu Abd Allah Amghar era conhecido por estar em contato com os maiores sufis e eruditos religiosos de sua geração e da geração de seu filho. Estes incluíram Abu Yaza Yalannur b. Maimun - (Sidi Abu Azza) o grande "marabout" do Médio Atlas; Abu Isa Wazgig al-Dukkali; Abu Muhammad Salih b. Yansaran al-Magiri; o grande jurista Maliki Abu Bakr b. al-Arabi e Qadi Iyad b. Musa al Yahsubi, autor do famoso Kitab al-Shifa li Huquq al-Mustafa. O texto de Bahjat al-Nazirin também indica que o sheikh inaugurou uma troca de ideias entre sufis do Iraque e do Marrocos e que, depois de sua morte, uma delegação do Iêmen veio visitar seu túmulo.
Embora não diretamente, os manuscritos marroquinos que mencionam o Ribat Tit-n-Fitr deixam a impressão distinta de que era considerado um modelo para outros ribats e que seus sheikhs eram vistos como típicos murabitin. A alcunha de Abu Abd Allah Amghar, "Abul-Budala" indica essa centralidade no sentido de que sete de seus descendentes foram considerados por outros sufis como badil (substituto) - aqueles sheikhs dentre os quais o Eixo da Era, ou Qutub, é selecionado. Até hoje, nos poemas de Dukkala são narradas as glórias dos Amghariyyum e lamenta-se a graça perdida que resultou da queda do mais antigo e nobre dos ribats marroquinos.
O sheikh Abdulaziz al-Amghari pertence aos Banu Amghar. O Moulay Abu Abdullah Muhammad Amghar é um dos seus antepassados.
Fonte: Ribat tit-n-fitr and the Origins of Moroccan Maraboutism (Ribat tit-n-fitr e as origens do Maraboutismo marroquino) de Vincent J. Cornell. Journal of Islamic Studies, Vol. 27:1, pág. 23-36 (14). 1988 - http://irigs.iiu.edu.pk:64447/gsdl/collect/islamics/index/assoc/HASH67f5.dir/v27i13.pdf - acessado em 14/02/2019.
Fonte: Ribat tit-n-fitr and the Origins of Moroccan Maraboutism (Ribat tit-n-fitr e as origens do Maraboutismo marroquino) de Vincent J. Cornell. Journal of Islamic Studies, Vol. 27:1, pág. 23-36 (14). 1988 - http://irigs.iiu.edu.pk:64447/gsdl/collect/islamics/index/assoc/HASH67f5.dir/v27i13.pdf - acessado em 14/02/2019.